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Writer's pictureCesar Ranquetat

Os estamentos tradicionais e as virtudes esquecidas



Cesar Ranquetat Jr



Um dos dramas decisivos da modernidade foi ter esquecido e eclipsado a ordenação social hierárquica presente nas culturas tradicionais, os conhecidos três estamentos: 1) oratores, 2) bellatores e 3) laboratores.


Seriam os correspondentes a: 1) Os sacerdotes/sábios, 2) Os guerreiros/heróis e 3) Os trabalhadores (camponeses e artesãos) que foram substituídos, em uma dinâmica de involução e degradação, pelos chamados: 1) Homens de letras/de cultura, 2) Burguês/mercador e - utilizando conceitos de Karl Marx – 3) Proletariado industrial/ lumpemproletariado.


Apesar do ocultamento destas realidades nas sociedades modernas e pós-modernas, ainda existe de forma residual, uma tradição política, uma tradição espiritual e uma tradição corporativa, artística e social de origem romana e cristã, ou seja, a ordem sacerdotal, a ordem da realeza, a e a ordem artesã, o que fora conhecido na antiguidade e no medievo como a tríade sacra do Sacerdotium, do Regnum, e do Ars. Segundo o pensador católico Silvano Panunzio, na própria estrutura do universo e, por consequência, no mundo social, há uma obra criativa (Arte), um princípio unitário de organização (ordem política, o Estado, representado simbolicamente pela Realeza) e um elemento de mediação transcendente entre o Criador e a criatura (o Sacerdócio).


Esta concepção orgânica e hierárquica da sociedade, marcas da estrutura política da Cristandade e das culturas tradicionais, apresenta antecedentes na filosofia clássica grega, em particular na República de Platão. O bem comum de uma sociedade, segundo Platão, está integrado por três tipos de bens necessários para a vida humana: os laços com o mais além, a defesa interior e exterior e os bens materiais e econômicos. Estes três tipos de bens definem três classes sociais, três atividades e estamentos, de cuja harmonia e colaboração resultam a ordem e o equilíbrio de uma sociedade política. Estas classes e/ou estamentos são: os sábios, os defensores ou guerreiros e os produtores ou o povo. Estes três estamentos ou classes de homens, presentes em todas as culturas, correspondem a três faculdades da alma: a razão, o ânimo e o apetite. A razão vincula-se ao sábios, estamento cuja principal tarefa é a direção espiritual e intelectual da comunidade política, o ânimo ou apetite irascível corresponde aos guerreiros, responsáveis pela defesa da cidade, e o apetite concupiscível corresponde ao povo, a classe dos produtores. Cada classe deve possuir uma virtude moral própria. A virtude do sábio deve ser a prudência, a virtude do guerreiro deve ser a fortaleza ou a coragem e a virtude do povo deve ser a temperança ou sobriedade. Da harmonia entre estamentos e virtudes surge a justiça na ordem social e na alma dos indivíduos.


Incontestavelmente, o fim das três ordens e o declínio das virtudes morais a elas associadas propiciou a instauração do mundo liberal, da sociedade de mercado, o predomínio da técnica e do cientificismo como visão de mundo e, sobretudo, o aburguesamento das mentalidades.


A cultura moderna é uma imensa máquina voltada contra o que resta da triparticão sociológica e antropológica tradicional, uma perpétua força de inversão e telurismo contra o que sempre definiu as atividades principais da criatura humana: orar, lutar e trabalhar com honestidade e amor com os pés na terra, e o coração e os olhos no céu.




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1 comentário


Fabio leonardo luz gomes
Fabio leonardo luz gomes
09 de mar. de 2022

Bom dia, Cézar.


Há alguma obra deste autor em português ou inglês? Não consigo encontrar.


Desde já obrigado.

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